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Urban Jungle

pensamentos, divagações e tangas da selva urbana

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11
Jan06

Caso de Vida

Cereza

Este é um tema que há devia ter sido tratado neste blog... não o foi, talvez porque nós mulheres tentamos evitar falar neste assunto... Medo, quem sabe!
Este é um testemunho do tamanho do Mundo... De uma coragem inspiradora. Obrigada MMM!



Sete horas da manhã.
Sai de casa no seu passo metódico mas desordenado, metida nos seus “jeans” já gastos pelo tempo, uma pólo azul escura e um agasalho pelo sim pelo não, sobre as costas. Vai tomar um café antes de apanhar o autocarro. Não se podia atrasar. Tinha uma mamografia marcada para as 8.30 horas da manhã e havia que contar com o tempo da viagem.

O dia amanhecera cheio de Sol e adivinhava-se o calor que iria cair sobre a cidade. Já no autocarro colocou os “head-phones” e sintonizou a rádio marginal. Como está lindo o dia, pensava.

Chegou antes da hora e às 8.40 foi chamada. Entrou numa salinha onde se despiu da cintura para cima e passou à câmara de tortura como muitas mulheres dizem. Não custa assim tanto, pensava, são só uns instantes.

Pode vestir-se a aguardar ao lado que a chamem de novo para fazer a eco–mamária. Assim fez. Sentou-se num banquinho. Decorou quase todos os pontos daquela salinha minúscula enquanto esperava ouvir o seu nome. Sim, sou eu… faz favor de entrar.

Perguntas sobre a família e o gel fresco na mama escorria. Não se vista, que uma enfermeira vai colocar-lhe um pequenino chumbo na mama para fazer novos exames.
Não se lembra se o Mundo tremeu, se o calor se transformou em frio ou se ainda era a mesma pessoa que tinha saído de casa horas antes. Sim, tudo bem. Chegou a minha vez. Até quando ? perguntava sem intervalos. Não, não vai ser desta ainda. Não, não pode ser, ainda lhe falta tanta coisa para fazer.

Completou o resto dos exames e com uma carta num envelope fechado disseram-lhe para ir o mais depressa possível à medica de família. Sim, iria, talvez… definitivamente depois das férias. Era Verão. Não ia morrer em pleno Verão. Foi de férias. Aproveitou os dias como se todos fossem os últimos, nunca se sabia o que iria acontecer.

Acabaram as férias e tratou de começar a arrumar “coisas”. Organizou papeis, conversou com quem há anos o não fazia, pediu desculpa por alguma dor que tenha causado, sentou-se com o Pai do seu Filho e desejou-lhe tudo de bom e que tomasse conta dele. Falou com o irmão de “homem” para Homem e pediu-lhe que tivesse força e que adoptasse o sobrinho para sempre, enquanto ia fazendo os exames que lhe tinham pedido para fazer.

Sentou-se ao pé do Filho e contou-lhe o que se ia passar. Perguntou-lhe: Quando? Quanto tempo? Que vais ter de fazer? Vais morrer? Explicou tudo e disse-lhe convicta que não, não iria morrer. Tá bem Mãe.

O resultado ela já sabia, mas os médicos precisam sempre de confirmações. Não sei bem para que. Existirá alguém que se conheça tão bem a si próprio como nós? É maligno. Vai ser operada depois de amanhã. Chorou e por mais que tentasse as lágrimas teimavam em não parar.
Como dar a noticia a uma Mãe? Na véspera, encheu-se de coragem e contou. Mãe, vai correr tudo bem, vai ver. Não vai ser desta, ainda.

Chovia. Saiu de casa sozinha. Pegou no saco e apanhou o autocarro. Entrou no Hospital e deu entrada. Tentava acreditar que era ela que ali estava. Pensou no Pai e pediu-lhe que tomasse conta dela, como o fazia quando ela era pequena. Tentou ser forte e de uma certa maneira conseguiu. Foi operada de manhã, bem cedo. Acordou cheia de frio e a rir. Acabava de chegar de um local onde todos sorriam e lhe acenavam dizendo até um dia destes …
Ao fim de quatro dias pegou de novo no saco e sozinha abandonou o hospital de regresso a casa.

Chegou sorrateira a quimioterapia e com ela adoptou um ar radical e passou a gostar de chapéus. A seguir a radioterapia e … assim passaram-se quase cinco anos. Ainda hoje tem a sensação que tudo foi um sonho menos bom. Apenas se lembra que não o é, quando se vê nua à frente de um espelho ou tenta estender a roupa e lhe dói o braço ou quando “foge” de alguém por ter medo de não ser aceite.

Quando tenta ser corajosa e se lembra que já não tem quem mais amou. Mas rejubila por ver tudo o que fez nestes quase cinco anos, porque teve o privilegio de ver o Filho crescer, de criar laços com pessoas que lhe aconteceram durante esse percurso. De continuar a ver o Sol e a chuva quando cai. De se poder agasalhar quando o frio aperta e passear ao longo da praia com o vento a bater-lhe na cara. De sentir o coração bater por se apaixonar e ferver de alegria por o sentir. Poder agradecer todos os dias que já passou sem pensar que existe o amanhã. Hoje é hoje e logo se vê. Talvez seja uma vencedora, talvez mas se o é, a todos que a rodeiam o deve. Obrigada

E a todos que me lerem, força e em especial para as MULHERES tomem conta de vós, não adiem, não tenham medo porque ser MULHER é ser Forte, é ser capaz, é ir sempre mais longe e NUNCA desistir.


MMM


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"Tough, you think you`ve got the stuff
You`re telling me and anyone
You`re hard enough


You don`t have to put up a fight
You don`t have to always be right
Let me take some of the punches
For you tonight



Listen to me now
I need to let you know
You don`t have to go it alone



And it`s you when I look in the mirror
And it`s you when I don`t pick up the phone
Sometimes you can`t make it on your own..."





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