Necessidade de humilhação
Pessoalllllllllllllllll as férias estão a correr bem, tirando o facto da minha mãe ter logo partido o pulso no dia que cheguei...engim... é o que digo, alguem me rogou uma praga!!! BOAS FÉRIAS PARA TODOS!
Fiquem com mais um conto da Alexandra... Um conto que poderá levar a várias interpretações!
-Não te esperava aqui. Hoje. Hoje não, percebes? Tenho muito que fazer.
- Podes ao menos ouvir-me? É que preciso desabafar com alguém... Não posso falar disto com outra pessoa.
- Entra e senta-te, então... olha que não tenho muito tempo...
Levo-o para a sala. Convido-o a sentar-se no sofá. Hoje estou com pouca paciência mas, verei o que posso fazer por ele.
- E então? Agora não falas? Pergunto enquanto procuro o maço de cigarros dentro da algibeira do pijama.
- É que... sabes... as palavras custam-me a sair... parece que estão presas na garganta ou, mesmo até, por baixo da língua...
As mãos dele não sossegam. Não sei se é por nervosismo, se é timidez, se o que é. Mas isto começa a irritar-me. A sala é invadida pelo fumo. Pego no maço de cigarros e ofereço-lhe um.
- Era bom se começasses a falar, sabes... é que tenho imenso que fazer, percebes? Vá, fuma um cigarro e tenta descontrair...
- Não percebo... não percebo como fui capaz de deixar levar-me por este sentimento de culpa... mas não consegui evitar...
- É... por vezes é mesmo assim... não sei se lhe possamos chamar egoísmo quando está em causa a nossa felicidade ou a do outro...
- E agora... não sei o que fazer... tenho a mente em branco... só penso nela... só nela... não adianta afastar-me, nem tentar unir o meu corpo ao de outra pessoa se a minha mente está constantemente presa á imagem dela...
- O amor tem destas coisas, não é verdade? Acabo o cigarro e apago-o de forma decidida enquanto o olho nos olhos. Só agora reparo...
- Estás um traste! Aposto que não tens feito outra coisa senão noitadas atrás de noitadas...
- Todos os dias... não consigo estar só. A solidão angustia-me, derruba-me, destrói-me ainda mais... não consigo ficar sóbrio, não consigo ir para casa e ficar ali a vegetar, sem ideias decentes na cabeça. Vou ter com alguns amigos. Vamos a vários sítios diferentes numa só noite. Bebemos. Eu bebo muito. Até cair para o lado. Depois acordo, por vezes, com mulheres que desconheço a dormirem ao meu lado, na minha cama, dentro da minha casa vazia... é deprimente.
- Imagino... mas, ao menos, dá para te distraíres, não?
- O pior... é que já não suporto vê-la com outro! Fico possuído por ódio e raiva!!! E depois, imagino coisas diabólicas que me atormentam os pensamentos... Por vezes penso que a odeio, e tenho vontade de a estrangular, de a retalhar... se isso a fizesse ser minha, só minha...
- Mas que coisa horrível... ouve, acho que andas mesmo mal da cabeça... Olha, isso deixou-me de tal maneira seca que vou buscar alguma coisa para beber... Queres?
- Hum... Sim, pode ser...
- Bem, vou fazer um gin tónico para mim mas, para ti trago-te um copo de leite, pode ser? É melhor que não bebas mais álcool senão ainda me estrangulas para aqui... não me confundas...
Consigo fazer-te sorrir da tua própria maldição. Consegues rir-te um bocadinho do terror que te atormenta.
Volto a sentar-me. Acendo mais um cigarro. E fico assim, a beber o meu gin e a observar a tua figura de menino rebelde arrependido, agarrado ao copo de leite como uma criança agarrada ao biberon... dá-me vontade de rir mas, sinto uma certa compaixão por ti. Devo dizer-te que, esse teu ar de cãozinho abandonado fica-te impecavelmente bem e, consegue tocar no mais íntimo dos meus sentimentos de bondade.
- E agora? Que queres que eu te faça?
- Apenas quero que me oiças... nada mais... é pedir-te muito?
- Nada posso fazer por ti... podia, enfim dizer... sim, mata-te! Pois deve ser preferível a matar alguém...
- Eu não a odeio... não, não lhe quero mal algum. Chego á conclusão que o odeio a ele. Odeio-o tanto!!!
- Ora... tu aceitaste as regras do jogo e agora lamentas-te??? Tu é que estás a mais... devias meter-te a milhas o quanto antes!
- Tu... tu, falas assim porque... porque não tens coração...
- Eu falo assim porque... olha, porque se calhar amei de mais não? E no teu caso, talvez fosse preferível o suicídio do que o assassínio... seria péssimo para a tua querida mãe saber que tinha em casa um presumível assassino...
Ele suspira. Parece uma lesma... uma lesma que arrasta pelos cantos do jardim da vida toda a sua melancolia.
- Ouve, eu não vou estar para aqui a servir de advogada do Diabo. Estas situações vindas da tua parte já eram de esperar. Eu avisei-te na altura que era arriscado meteres-te com ela... pensaste que podias dar umas cambalhotas no parque de diversões da tua cama mas, por vezes, as coisas nem sempre são assim.
Ele continuava em silêncio.
- Devo dizer-te o quanto me irrita eu estar para aqui a discursar e tu aí... sempre nesse silêncio! Realmente, não sei bem porque insistes sempre em vir cá. Já sabes de ante mão que eu e tu não servimos nem para uma conversa de jeito. A tua figura, nestes momentos, enerva-me de tal maneira... e depois, não falas, não dizes nada e, quando abres a boca, enfim... é o que se espera... Mais valia atirares-te para o chão e gritares, esperneares... mais valia que chorasses!
- Desculpa... não queria que isto tivesse chegado a este ponto...
- Sabes bem que também não ando em boa maré... Ouve, vai para casa, tenta descansar. Não voltes a encontrar-te com ela se não te sentes suficientemente forte para enfrentar a situação... Ah! E acaba lá de beber o leitinho todo antes de ires! Sorrio e dou-lhe uma pancadinha leve na cabeça.
- Não há nada a fazer?
- Não... considera-te um caso perdido... vai para casa e arquiva-te! É o melhor que tens a fazer...
Levantamo-nos. Levo-o até á porta. Não nos beijamos sequer. Já nos beijámos excessivamente no passado. Nada mais nos prende a não ser a necessidade de palavras bruscas de vingança e perdão.
alexandraantunes